JESUS, EU CONFIO EN VÓS

Somo Servos da Misericórdia Divina.

O que é extraordinário, nos textos e mensagens entre Jesus e a Irmã Faustina, é que em qualquer dos textos citados podemos identificar-nos com a Irmã Faustina, como se estas mensagens estejam diretamente dirigidas a cada um de nós. A alma que tem sede de Deus, e por ter procurado uma intimidade com Ele, mas sem saber como a alcançar, está agora em plena consciência, enquanto anteriormente não distinguia claramente a Sua voz, nem compreendia a Sua mensagem, a partir da leitura das declarações de Jesus e suas interpretações da Irmã Faustina, o véu abriu-se e agora tudo ficou transparente e nítido.

Estas mensagens, que nos foram dirigidas, ao longo de toda a nossa vida, ganharam sentido, ultrapassando a barreira do tempo e agora disponíveis e compreensíveis para todos aqueles que o desejam, em comunhão com os Santos e a Santa Igreja, pela graça da Misericórdia Divina.


Diariamente, colocaremos citações da obra de Santa Faustina, ou de outros autores que também receberam graças muito especiais, que o ajudará, com certeza, na sua meditação diária.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

DISCERNIMENTO

DISCERNIMENTO NOS PENSAMENTOS, VICIOS E VIRTUDES


1- O discernimento nas pessoas que iniciam aos serviços de Deus, é um conhecimento exato que elas tem do seu estado da alma, em comparação com aquelas que já fizeram algum progresso no serviço do Senhor, é um sentimento interior que lhes concede a distinção na maior certeza do bem referido, daquele que é apenas natura e muitas vezes faz guerra ao bem sobrenatural; e naquelas que felizmente já atingiram a perfeição, com o conhecimento vindo de Deus, em abundantes luzes que se expandiram  nas suas almas, e que por meio delas, não apenas restauram as fendas nos seus corações, como ainda penetram até ao interior de seus irmãos. Mas se queremos definir o discernimento de uma forma geral, englobando e o que é conveniente para todos, dizer-se-à o que ela é ou que deveria ser esta luz interior que nos dá a conhecer, com toda a certeza, e em todo tempo, e em qualquer lugar, e em todas nossas ações, sendo a santa e adorável vontade de Deus, e apenas recebidas por aqueles que são puros nos seus afetos, nas suas ações, e nas suas palavras.      

2- Aquele que pelo Espírito de Deus venceu os três inimigos da sua salvação, vem facilmente corrigir os cinco outros, mas aquele que negligencia de atacar e de vencer estes três inimigos, não pode contar com outra vitória. O discernimento é portanto a consciência sem mancha, que reside apenas naqueles com pureza e castidade dos sentidos. 

3- Ninguém, que seja por si, ou ouvindo de da boca de outros, que no estado religioso acontece coisas extraordinárias e sobrenaturais, não pode, visto que não conhece a natureza, as evocar em vão; porque onde habita Deus, que está acima de toda a natureza, aí pode encontrar coisas alem da sua natureza e das leis ordinárias.

4- A preguiça, o orgulho, o os desejos dos demónios, são as principais armas cujo seus espíritos infernais se servem para nos fazer guerra. A primeira das suas armas deve-nos cobrir de confusão, a segunda precipita-nos na ultima das misérias; a terceira, é uma verdadeira e perfeita felicidade.

5- Depois de Deus, é na nossa consciência que devemos recorrer, como uma regra que teremos de seguir: é ela que está encarregada de nos mostrar de que lado correm os ventos impetuosos das tentações, de nos avisas quando é necessário de estender as velas, e de nos dirigismos para evitar um triste naufrágio.

6- Os demónios, em todos nossos exercícios de piedade, prega-nos partidas  para cairmos nas três fossas que eles próprios prepararam. Em primeiro, eles esforçam-se de nos desviar do bem , depois, caso sejam vencidos neste primeiro combate, procuram corromper o nosso coração, inspirando-nos más intenções, para nos impedir o nosso propósito da maior gloria de Deus; e caso neste segundo ataque seus esforços ficarem em vão, escondem-se nas nossas almas, assim mais tranquilas, no intuito de poder inspirar-nos  confiança e felicidade, deixando apenas que seja feita a vontade de Deus, para a sua maior glória. Confiante assim na nossa felicidade, facilmente caimos na primeira tentação entregue pelo pensamento, com grande diligência, pela escrupulosa execução dos nossos deveres. Na segunda, pela obediência e pelo desprezo de nós mesmos; e a terceira, pelo conhecimento da nossa imperfeição e da inutilidade das nossas obras.

Aqui está este precioso trabalho a realizar  constantemente até que o fogo do amor de  Deus nos faça entrar no seu santuário.

A Escada Santa - de São João Climaco
Tradução própria
Fonte: http://livres-mystiques.com


quarta-feira, 28 de agosto de 2013

A GRANDEZA DE MARIA

A grandeza de Maria, tudo ultrapassa: Sua fé!

"Ele disse: Aqui estão minha mãe e meus irmãos, porque aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos Céus, esse é meu irmão, irmã e mãe (Mt 12, 48-50). 

O que nos ensina Jesus com esta afirmação, senão que devemos ter  consciência do nosso parentesco espiritual, antes do parentesco segundo a carne, e que Ele quer manter os homens felizes, não porque eles estejam ligados aos justo e aos santos, através do sangue, mas porque, seguindo a sua doutrina e os seus exemplos, assim eles se tornam seus aliados. 

Por este motivo, Maria foi mais feliz em receber a fé de Cristo do que conceber a carne de Cristo. Pois àquela que lhe disse: Felizes as entranhas que te trouxeram e os seios que te amamentaram!   Jesus respondeu: Bem mais felizes são aqueles que ouvem a palavra de Deus e a observam. (Lc 11, 27,28).

Santo Agostinho 
Em De sancta virginitate, 3 ( A Sagrada Virgindade, 3)

terça-feira, 27 de agosto de 2013

A PALAVRA DE DEUS EM MÚSICA

Sob a despretensiosa simplicidade do canto gregoriano oculta-se uma profunda riqueza que reporta a alma a um mundo misterioso e sobrenatural. Qual o segredo da atração desta antiquíssima forma de música sacra?
Irmã Kyla Mary Anne MacDonald, EP
Imersos na agitação do mundo atual, sempre absorvidos pela pressa, pela velocidade e pelo ruído, talvez não nos seja tão fácil conceber um ambiente diferente. Entretanto, convidamos o leitor a parar um pouco agora, e imaginar...
Imaginar um mosteiro, com um claustro austero, silencioso, acolhedor e elevado, por onde circulam alguns monges, gregoriano_.jpgsem pressa e recolhidos, dirigindo-se a uma capela iluminada apenas pela luz tamisada por uns belos vitrais coloridos.
Estes valorosos homens, tendo abandonado tudo para o serviço da Religião, dedicam sua vida ao trabalho, ao estudo e à oração. E como forma de externar o amor transbordante de seus corações, habitados pela graça, se unem em uma só voz para dirigir-se a Deus. Em uníssono, entoam hinos e cânticos que enchem o templo sagrado de melodias suaves e apaziguantes...
Já estará nosso leitor com o estado de espírito pronto para compreender qual é este estilo de canto e suas origens, para admirar a misteriosa riqueza e a elevada qualidade que fizeram dele o cântico sacro por excelência.
O canto gregoriano
O canto gregoriano é uma forma de música diferente de qualquer outra executada, hoje, no Ocidente. Distinto da polifonia, ele é uníssono e sua perfeição é atingida quando uma única voz se faz ouvir, mesmo sendo grande o conjunto que o entoa.
Em contraste com outros estilos musicais, nos quais um compasso regular e ritmado pode ser logo percebido, o canto gregoriano é caracterizado por seu ritmo livre, parecendo flutuar no ar, liberto do tempo, em um movimento ascendente
e descendente assemelhado às ondas do mar.
Enquanto a música comum e corrente, de modo geral, é composta em uma escala maior ou menor, dando-lhe características distintas de tristeza ou alegria, os oito modos do gregoriano transmitem uma gama mais sutil de expressão, num equilíbrio perfeito, parecendo sempre evitar os extremos emocionais dramáticos.
Estas são apenas algumas das razões pelas quais, para ouvidos pouco acostumados a ele, o canto gregoriano pode dar, à primeira vista, a impressão de ser monótono. Contudo, ao deixar-se levar por sua harmonia, a pessoa é tocada pela força singular de uma forma de canto que traz consigo séculos de sabedoria e reflete gerações de talentos religiosos que convergiram rumo à perfeição de suas melodias - suas "inspiradas modulações",1 na expressão do Papa
João Paulo II.
Assim, apesar de uma aparência simples, carrega dentro de si, como observa o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, uma formidável riqueza, "uma potencialidade quase inexaurível de gerar civilizações e maravilhas em qualquer parte do mundo. É a força da inocência aliada à graça, que transformou, por exemplo, os pântanos e vales mefíticos da antiga Europa em jardins salpicados de vida e de cor, onde, entre arvoredos e lagos lindíssimos, avantajam-se grandiosas abadias, imponentes castelos e majestosas catedrais. Uma Europa ‘gregorianizada'".2
Poder de mover as almas
Um dos mais ilustrativos exemplos do poder transformador deste canto o temos na conversão dos anglos. A iniciativa do Papa São Gregório I, o Magno, de penetrar na ilha dominada por estes bárbaros foi marcada pelas seguintes palavras: "o louvor de Deus Criador deve ser cantado naquelas terras".3 Sob sua direção, Santo Agostinho de Cantuária entrou na Grã-Bretanha, em cortejo com 40 outros beneditinos, entoando as "solenes e tocantes melodias que lhes havia ensinado Gregório, seu pai espiritual e pai da música religiosa".4 O celestial canto dos recém-chegados foi decisivo para a conversão do povo, em pouco tempo.
Tal episódio, um entre tantos no processo de "gregorianização" da Europa Ocidental, mostra que o Papa - cujo nome deu origem à denominação deste estilo musical - possuía uma profunda compreensão de como a música pode mover as almas com mais eficácia do que conseguem as simples palavras. Aqueles cantos eram a mais sobrenaturalizada das músicas e, no entanto, foram capazes de cativar bárbaros e camponeses completamente ignorantes em coisas espirituais e não habituados a refinados sons.
É o que ficou registrado na História: Gregório I "compôs com grande trabalho e destreza musical os cantos que são cantados em nossa Igreja e por toda a parte. Por este meio, ele influenciava mais efetivamente os corações dos homens, elevando-os e animando- -os; e, na verdade, o som de suas doces melodias conduziu não apenas homens espirituais à Igreja, mas até mesmo os rudes e insensíveis".5
Sao_Gregorio_Magno.jpg
São Gregório possuia uma uma
profunda compreensão de como 
a música pode mover as almas


"São Gregório Magno", por Francisco 
de Zurbarán Museu de Belas
Artes, Sevilha (Espanha)
Um novo impulso à unificação da música sacra
Uma tradição medieval relativa ao santo também mostra a multissecular crença de que o canto gregoriano lhe foi divinamente inspirado e explica o motivo de ser ele representado, muitas vezes, com uma pomba ao ouvido, e transcrevendo uma música que lhe está sendo ditada.
"Foi enquanto considerava o fascínio exercido pela música profana que Gregório foi levado a se perguntar se ele não poderia, como Davi, consagrar a música ao serviço de Deus. Uma noite, teve uma visão na qual a Igreja lhe aparecia sob a forma de uma musa, escrevendo suas melodias e reunindo seus filhos sob as dobras de seu manto. Sobre este manto estava escrita a arte da música, com todas as formas de seus tons, notas, neumas, e vários compassos e harmonias. Ele rezou para que Deus lhe desse o poder de recopilar tudo o que tinha visto. Ao acordar, uma pomba apareceu e ditou-lhe as composições musicais com as quais ele enriqueceu a Igreja".6
São Gregório usou este especial dom artístico para proporcionar um complemento decisivo ao trabalho de outros que o antecederam na música litúrgica - notadamente Santo Ambrósio7 -, dando uma harmonia final e unificada ao canto da Igreja em Roma, e impulsionando a sua implementação universal em toda a Europa Ocidental, causa que seria levada adiante por grandes homens depois dele, em particular Carlos Magno.
O assunto música sempre foi importante para a Igreja. Toda a Idade Média - bem como o mundo antigo antes dela - foi marcada por um grande interesse pela compreensão da influência dessa arte sobre a alma. O canto gregoriano, que atingiu seu auge por volta do século XIII, representa o fruto de um longo processo de explicitação e de aprimoramento.
"Canticum novum" na Igreja
Desde os tempos antigos, o povo louvava a divindade com cânticos. Na verdade, observa o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, a alma humana "procura a música para exprimir seus mais altos anelos, seus mais altos desejos, suas mais altas expressões".8 Santa Hildegarda de Bingen reconhece esta inclinação, afirmando que, em estado de perfeição original, Adão no Paraíso, antes da queda, cantava em vez de falar, e em sua voz "havia o som de todas as harmonias e suavidades de toda a arte musical".9
Era natural que com o estabelecimento do Cristianismo um novo cântico viesse caracterizar o culto litúrgico da Igreja. Os primeiros patrocinadores da salmodia e da hinologia cristãs não olhavam senão para o Homem-Deus como o inspirador deste canticum novum, pois, após a Última Ceia, "o próprio Senhor, um professor nas palavras e mestre nos fatos, [...] saiu do Monte das Oliveiras com os discípulos, depois de cantar um hino".10
Quando se deu a assinatura do Edito de Milão, pelo Imperador Constantino, foi permitido que o culto público dos cristãos florescesse e os fiéis encontraram no canto uma bela maneira de expressar e inspirar o amor a Deus, a contrição, as súplicas, ajudando a alma a louvar o Criador.
Contribuições de três mundos antigos - a teoria musical grega, a língua e as regras da métrica literária romanas e os livros sagrados dos judeus - se uniram para desenvolver uma arte sacra inteiramente nova, visando ajudar os textos sagrados a inspirar os corações daqueles que os ouviam.
Um elo entre o mundo dos sentidos e do espírito
Durante os primeiros séculos do Cristianismo, os Padres da Igreja viram na música e, sobretudo, no canto, um elo entre o mundo dos sentidos e o do espírito que poderia ajudar o homem no processo de transcendência espiritual. A esse respeito, as palavras de São João Crisóstomo são significativas: "Nada desperta tanto a alma, dando-lhe asas, deixando-a livre da terra, liberando- a da prisão do corpo, ensinando-a amar a sabedoria e rejeitar todas as coisas desta vida, como a melodia concordante e o cântico sacro".11
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O poder transformador do gregoriano foi demonstrado
durante a conversão dos anglos


"São Gregório Magno no mercado de escravos de 
Roma" Catedral de Westminster, Londres
Misteriosa era, porém, a questão de como a palavra cantada obtinha maior entrada na alma do que a palavra falada. Santo Agostinho observa: "sinto que o nosso espírito se move mais religiosa e ardentemente para a chama da piedade com aquelas letras sacras, quando assim são cantadas, do que se não fossem cantadas deste modo"; refletindo mais sobre este mistério, não é capaz de explicá-lo inteiramente: "todos os afetos do nosso espírito, cada um segundo a sua diversidade, têm na voz e no canto as suas próprias medidas, não sabendo eu qual é a oculta afinidade com essas melodias que os desperta".12
A perspectiva medieval da música é também demonstrada por Boécio: "a música é de tal forma parte de nossa natureza que nós não podemos passar sem ela, mesmo que queiramos".13 Para ele, os ouvidos são vistos como uma vereda direta para a alma, a qual é altamente suscetível às influências da música.14
Parte da eficácia da música na conquista do acesso à alma foi atribuída à sua inata qualidade de agradar. Ela eleva a expressividade das palavras no cântico, tornando- as de mais fácil recordação ao ouvinte. São Nicetas chamava a música sacra de "remédio, suficientemente poderoso na cura das feridas do pecado, embora doce o suficiente ao paladar, por sua virtude. Por isso, quando um salmo é cantado, é doce ao ouvido. Penetra na alma porque é agradável. É facilmente retido, se é repetido com frequência".15
É ainda Santo Agostinho quem testemunha ter sentido, em si, tais benefícios, referindo-se à música da Igreja como uma das mais poderosas influências para sua conversão. Suas palavras uma vez mais sublinham como a alma é iluminada pelo que captam os ouvidos: "Quanto chorei ouvindo vossos hinos, vossos cânticos, os acentos suaves das harmonias que ecoavam em vossa Igreja! Que emoção me causavam! Fluíam em meu ouvido, destilando a verdade em meu coração".16
Antes da difusão dos livros, quando a fé literalmente vinha através do ouvido (cf. Rm 10, 17), os cânticos eram também importantes instrumentos didáticos de doutrina. Santo Atanásio, no Oriente, por exemplo, e Santo Hilário de Poitiers, no Ocidente, fortaleceram as populações, contra os males do arianismo, escrevendo hinos os quais refutavam seus erros. Deste modo, as verdades da Fé eram fácil e afetuosamente assimiladas, atingindo um público muito maior do que as palavras escritas, porque, como ressalta a historiadora Régine Pernoud, "naquele tempo, se nem todos aprendiam a ler, todos aprendiam a cantar".17
Defensor do valor pedagógico da arte sacra, São Gregório Magno assim escreveu para dissuadir as atividades iconoclastas de um de seus bispos: "O que a Escritura é para os letrados, as imagens são para os ignorantes; [...] elas são para o povo a sua leitura".18 Porém, em terras onde apenas começavam a experimentar a Civilização Cristã, o esplendor dos vitrais e outras artes visuais tardariam em aparecer. Discerniu ele, então, estarem as melodias do canto gregoriano preparadas para fluir sobre as almas de seus ouvintes com toda sua grandeza, exercendo o mesmo tipo de influência educativa que as outras artes.
San Gregorio Catedral de Sevilla.jpg
Uma tradição medieval narra ter sido o canto
gregoriano divinamente inspirado


"Aparição da pomba a São Gregório"
Catedral de Sevilha, Espanha
Os beneditinos e os ouvidos do coração
Já nos primórdios da Igreja, então, o cântico sempre fez parte do culto, nas mais diversas ocasiões, onde quer que os fiéis se reunissem (cf. I Cor 14, 26). No entanto, como a era dos mártires deu lugar à era dos monges, a arte do canto litúrgico encontrou o local ideal para seu cultivo: os mosteiros. São João Cassiano, o eremita do Egito que introduziu o ideal do monaquismo na Gália, com o estabelecimento da Abadia de São Vitor, em Marselha, ensinava: "Nós, com frequência cantamos os salmos, de maneira que podemos continuamente crescer em compunção".19
O monaquismo que proliferou inicialmente na Europa Ocidental imitou de perto o monaquismo do deserto, do Oriente. Contudo, encontrou sua própria nota distintiva com a fundação dos beneditinos, em Subiaco, no século VI, e, por esta razão, São Bento é aclamado Pai do monaquismo ocidental.
Exerceu ele - de quem se pode dizer ter aplicado o dom romano do direito e da ordem às instituições monásticas - a mesma influência aperfeiçoadora sobre o canto sacro. O próprio São Gregório tinha sido monge antes de ocupar o sólio pontifício, e foi sua afinidade pessoal com os beneditinos que lhe deu um conhecimento completo dos modos do canto litúrgico, os quais serviram como matéria-prima do canto gregoriano. Os sábios beneditinos, por sua vez, historicamente tomariam a liderança na sua interpretação, preservação e restauração.
Para os beneditinos, assim como o trabalho era realizado em comum, era natural que sua tarefa primeira, o "trabalho de Deus" - como São Bento chama o Ofício Divino -, também devesse ser partilhado em comunidade, e era a clave de sua espiritualidade e de sua vida diária. Em sua regra, São Bento admoesta: "estejamos sempre atentos ao que diz o profeta: ‘Servi ao Senhor com temor'; e também: ‘Cantai sabiamente' e ‘Na presença dos anjos, cantarei a Vós'. Portanto, consideremos como devemos nos comportar na presença de Deus e de seus anjos e, desta forma, participemos do ofício de maneira que a mente esteja de acordo com a voz".20
É curioso o fato de o canto sacro ter florescido e adquirido sua forma mais perfeita em um ambiente onde, para favorecer a contemplação, os monges "deveriam ser zelosos em manter sempre o silêncio".21 O canto, que preenchia a maioria das horas de vigília, evidentemente não quebrava o silêncio interior dos monges, mas era consonante com ele e, de fato, fruto dele.
"Ausculta, o fili [...] et inclina aurem cordis tui"22 - "Ouve, filho, e inclina os ouvidos de teu coração" é a exortação de abertura da regra beneditina. Silêncio que abre os ouvidos do coração para a voz não pronunciada da graça e torna a alma mais perceptiva para os significados mais profundos das palavras. Comenta o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira que os aspectos imponderáveis existentes no som musical ajudam a revelar este aspecto imponderável da palavra e "põem em foco uma porção de coisas que o sentido literal da palavra não diz".23
A palavra de Deus em música
Ao atingir o século XII, os beneditinos, em seu aperfeiçoamento do canto sacro, tiveram grandes discernimentos sobre a "oculta afinidade" entre palavra, música e alma, considerada por Santo Agostinho, como foi visto. Santa Hildegarda de Bingen via a palavra e a música como uma representação mística da união da natureza humana e divina, na Encarnação: "a palavra designa o corpo, mas a música manifesta o espírito. Porque a harmonia do paraíso proclama a divindade do Filho de Deus, e a palavra faz conhecer sua humanidade".24
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"Ouve, filho, e inclina os ouvidos
de teu coração" - assim inicia a
regra beneditina
Detalhe de "Nossa Senhora entronizada
com santos e anjos", por Agnolo Gaddi
National Gallery of Art, Nova York
São Bernardo mostra como os ouvidos corporais estão relacionados aos ouvidos do coração, ensinando dever o canto "agradar o ouvido a fim de mover o coração".25 O Doutor Melífluo - ele próprio autor de grande número de hinos em estilo gregoriano - afirma que os cânticos devem ser, acima de tudo, resplandecentes com a verdade, de maneira que a melodia "não deve obscurecer o significado do texto, mais propriamente, deve fazê-lo frutífero".26
No século XIII, São Tomás de Aquino combinaria suas habilidades musicais - as quais ele desenvolveu durante sua formação juvenil com os beneditinos de Monte Cassino - com sua extraordinária capacidade dominicana de ensinar, para
compor, ambas, as melodias e as palavras de alguns dos mais valiosos hinos eucarísticos da Igreja. Para ele, "um hino é o louvor a Deus com cântico; um cântico é uma exultação da mente habitando nas coisas eternas, irrompendo na voz".27 Sua obra prima, Lauda Sion Salvatorem, melodicamente encerra toda a doutrina da Igreja relativa à Eucaristia.
O canto gregoriano, então, consistindo tão somente de palavras com uma única linha melódica, "traz o ‘ouvido do coração' muito perto da palavra divina, com a finalidade de ouvi-la diretamente".28
Pio XII elogia esta qualidade do canto gregoriano: "Pela íntima aderência das melodias às palavras do texto sagrado, esse canto não só se enquadra a este plenamente, mas parece quase interpretar-lhe a força e a eficácia, instilando doçura na alma de quem o escuta; e isso por meios musicais simples e fáceis, entretanto, permeados de tão sublime e santa arte, que em todos suscitam sentimentos de sincera admiração".29
O componente musical do canto gregoriano possui ricos instrumentos de expressão a fim de colocar o texto em alto relevo, quase se tornando um com as palavras, como demonstra D. Dominic Johner: "A música gregoriana, todavia, não é meramente uma música de ornamento; ela não descreve o texto como uma guirlanda cinge uma coluna, sem conexão íntima com ela. O canto pode também tornar o texto interpretativo, expressivo e explanativo. Com frequência traz suas graduações até o ponto exato em que uma interpretação declamatória do texto cresce em calor e enfatiza aquela palavra que marca seu clímax. [...] Tornar-se-á evidente que o canto une de modo perfeito o texto e a melodia, e que há uma íntima relação, uma união de espírito, entre eles".30
Um dos meios pelos quais o canto gregoriano revela o significado textual é através do uso da ordem das notas, ascensões, descidas e intervalos, cada um dos quais desempenha um determinado papel na interpretação do tema cantado. D. Johner ainda esclarece que os intervalos maiores e ascendentes denotam maior envolvimento da sensibilidade do que os intervalos menores e descendentes. Deste modo, uma frase melódica composta principalmente de segundas e terças - padrão predominante na maioria dos cantos - estabelece um ambiente de moderação e serenidade, com uma grande capacidade para a expressão de reverência e terna confiança. Em contraste, um intervalo de quarta cria um impacto mais forte; ascendendo, é portentoso, festivo. Para o intervalo de quinta é reservada a expressão das mais profundas experiências do espírito, seja tristeza, serena felicidade ou fé profunda e admiração.31
Em momentos fugazes, a linha melódica do canto parece até mesmo interromper a dimensão verbal e levantar voo em puro jubilus, uma expressão musical de uma alegria além das palavras, que tipicamente ornamenta uma palavra como Alleluia. Esta forma de vocalização livre é, na pena de Santo Agostinho, "a voz do coração irrompendo em alegria, e procurando também expressar sentimentos cujo significado talvez nem compreenda. [...] Quando somos jubilosos? Quando glorificamos algo que não pode ser expresso".32
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É dever do canto, ensina São
Bernardo, "agradar o ouvido a fim
de mover o coração"
"São Bernardo", por Arnaldo Bassa
Museu Nacional de Arte da Catalunha,
Barcelona (Espanha)
Expressão do sobrenatural: tônico das almas
Para São Gregório Magno, o canto sacro pode de fato preparar o coração para a ação de Deus: "Através da voz da salmódia, quando é entoada com a força do coração, um caminho está preparado para o Senhor onipotente, de modo que Ele possa derramar na mente atenta os mistérios da profecia ou a graça da compunção. [...] Quando Lhe cantamos, abrimos um sendeiro para que Ele possa vir à nossa alma e inflamar-nos, pela graça de seu amor".33 O primeiro monge Papa também compreendeu que certos sons musicais podem favorecer este encontro, em uma natureza humana tão inclinada a ater-se aos aspectos temporais e materiais da existência.
Por exemplo, uma peça musical convencional termina na nota tônica, dando um sentido de conclusão. A melodia do canto gregoriano, em contraste, quase sempre não faz esta resolução final na última nota, evocando um sentido do infinito, de eternidade. Ademais, pela extrema leveza de seu movimento, o canto gregoriano é interpretado da maneira a mais espiritual possível, embora permaneça dentro do domínio dos sentidos, pois, como comenta D. Mocquereau, ele "toma emprestado o mínimo possível do mundo material e se move, invisivelmente; ele avança, porém, imponderavelmente".34
Estas sugestões de imaterialidade e eternidade ecoam no canto gregoriano, e, quando assimilado ao longo do tempo pela alma, podem ajudar na formação de um estado de espírito correspondente e salutar. Para o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, ouvir canto gregoriano "lembra o aspecto penitencial, adverte contra o vazio das coisas terrenas, contra o mentiroso dos élans excessivos do próprio homem. Assim é o gregoriano. Das alegrias exultantes do Te Deum aos recolhimentos solenes do Tantum ergo, é a música que tem essa qualidade incomparável de exprimir a atitude perfeita, o exato grau de luz da alma reta e verdadeiramente inocente quando se coloca diante de Deus".35
Depois de haver feito o leitor passear pelos panoramas do canto gregoriano, o qual coloca a alma na dimensão do sagrado tão distinto do mundo em que vivemos, ao terminar queremos deixar-lhe um conselho: "Procure ter seu temperamento no estado do espírito do canto gregoriano, e terá encontrado uma via certa para a sua santificação".36
(Revista Arautos do Evangelho, Jan/2012, n. 121, p. 18 à 25)

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

A ESCADA PARA O CÉU (2.ª parte)

OUTRAS VIRTUDES DA OBEDIÊNCIA


No meio dos respeitáveis monges, eu vi acontecimentos que podem também vos ser úteis e cheios de admiração: por exemplo, reparai uma comunidade de monges, formada pelo Espírito Santo, e fortalecida pela mais perfeita caridade. Eles tinham em comunhão, o que há de mais excelente, seja na acção, seja na contemplação, eles dedicavam-se com tanto fervor nos seus exercícios de vida religiosa, que eles quase não precisavam dos avisos e conselhos do superior: tanto eles exerciam-se uns aos outros com fervor, numa diligência quase divina. Eles tinham acertado, regulado e determinado certas práticas de piedade, todas individuais, como por exemplo, em caso de ausência do padre, a caso acontecesse que algum deles, falasse de um outro de forma pouco conveniente, ou de o condenar por um julgamento sem fundamento, ou de dizer algumas palavras inúteis, de seguido um irmão, por um sinal secreto, o advertia da sua falta, encaminhando-o para o seu dever; e caso o monge parecesse não entender, ou por não reconhecer o sinal referido, então aquele que o advertia, devia prostrar-se e retirar-se. Nos momentos de recreio, o pensamento sobre a morte e do julgamento era o tema ordinário e habitual de suas conversas.

Impossível de não falar-vos da rara e singular virtude do irmão que estava encarregado de preparar as refeições. Como nas ocupações tumultuosas ao seu cargo eu via-o dum recolhimento  admirável, e ensopado em lágrimas, então supliquei-lhe de não tomar a mal que lhe perguntasse de que forma ele tinha obtido de Deus um tão grande favor. Vencido pela minha insistência continuada, ele deu-me esta resposta: " É, diz-me-ele, porque na minha tarefa, nunca servi os homens, mas Deus ele-mesmo, que me tenho julgado indigno de qualquer descanso, e de toda tranquilidade, e vendo sempre na minha frente o fogo material, vista esta que me recorda sem cessar a lembrança das chamas eternas." 

Considerando ainda uma outra prática de piedade não menos rara nem menos admirável. À mesa, estes fervorosos monges não interrompiam suas santas meditações e por signos particulares, eles advertiam-se uns aos outros de permanecer o espírito na oração e meditação; esta prática era habitual, e não só à mesa, mas todas as vezes que se encontravam, ou se reuniam.

A caridade de uns pelos outros era admirável, porque, se acontecia a qualquer um deles de cometer qualquer falta, ou qualquer omissão, os outros iam ter com ele para lhe pedir com insistência de descarregar sobre ele a dor ou a pena e assim dar conta ao superior desta fraqueza, e de receber ele mesmo a repreensão e o castigo. Daí que o padre reconhecia bem quais eram os sentimentos de caridade que reinava dentro dos corações de seus monges, e que, não podendo ignorar que o culpado não estava no meio daqueles que se apresentavam perante ele. Ele os repreendia com menos severidade e castigava-os com menos rigor, sem se dar ao trabalho , de procurar conhecer qual foi aquele que cometeu a falta.

A Escada Santa - de São João Climaco
Tradução própria
Fonte: http://livres-mystiques.com


sexta-feira, 23 de agosto de 2013

A ESCADA PARA O CÉU

Quarto degrau da Escada santa

A OBEDIÊNCIA

A obediência é a mais perfeita renuncia da sua própria vontade, e com principal relevo nos seus atos exteriores; sendo a completa mortificação das paixões numa alma em plena vida, o melhor caminho  que nos conduz à simplicidade mais perfeita, sem nenhuma opção, nem desejo de curiosidade, alcançando  total segurança mesmo em meio de perigos, e excelente meio de defensa para comparecer perante Deus, como segurança desejável na hora da morte. A obediência dá  à alma a paz e a calma contra o medo da morte, aniquilando a vontade, fazendo reviver a humildade; ela não resiste e nunca contesta ; nunca pronuncia nenhum julgamento, olhando com indiferença, tanto os bens como os males, da vida mundana. Assim o homem que saiba mortificar-se santamente, pondo o seu coração no jugo da obediência, nada terá de recear pelas suas ações, e comparecera perante Deus com uma confiança absoluta. Por fim diremos que a obediência é uma renuncia completa à suas opções pessoais e ao seu próprio julgamento, porque os submetem à luz e julgamento dum superior.
4. No entanto, devo acrescentar, que no início desta mortificação, como morte religiosa pela qual 
é indispensável crucificar a vontade do coração, dos sentidos e da carne, que acompanhados por muitas obras e  castigos; os progressos que se faz na obediência, são ainda seguidos de suores algumas dificuldades; mas por fim encontra-se felizmente liberto de pesadas e dolorosas sensações  e entramos na paz e numa tranquilidade perfeita : porque o única pena que sente este feliz homem da obediência, morto e vivo ao mesmo tempo, é de reconhecer que ele seguiu em algumas coisas a sua vontade: e por isso tem medo de ter de responder a Deus da determinação que ele tomou dele mesmo. 

A Escada Santa - de São João Climaco
Tradução própria
Fonte: http://livres-mystiques.com

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

TRATADO DO PURGATÓRIO (PARTE 3)

3. Sofrimento das almas do purgatório, a separação de Deus é a sua maior pena

Por outro lado, a pena que sofrem é tão intensa que não existem palavras que possam o exprimir, nem inteligência que possa entender o brilho se Deus não lha revela por uma graça muito especial.
Este brilho , Deus o produz nesta alma por uma graça, que lhe dá a conhecer, sem poder o exprimir por palavras. Este conhecimento que Deus me revelou nunca saiu de meu espírito. Posso dizer apenas o que me é permitido, e às almas que o compreendem, a quem o Senhor se dignou abrir-se-lhes o entendimento.
A fonte de todo sofrimento é o pecado, que seja o original, ou  o atual. Deus  criou a alma perfeitamente  pura e simples, sem nenhuma mácula de pecado e  com um instinto beatífico que a leva até Deus.
Deste instinto, o pecado original, onde nela se encontra, a desvia. O pecado atual, quando nele se mistura , o afasta ainda mais. Mais ela se distancia, mais ela se torna rui, porque Deus já não concilia com ela.
Tudo que se encontra de bom nas criaturas apenas existe pela comunicação que Deus faz com elas. Às criaturas irracionais, Deus deu-lhes como instinto o  propósito, que faz parte integrantes delas e que jamais lhes será retirado.
Na criatura dotada da razão, à alma corresponde, mais ou menos, um estado onde se encontra purificada do impedimento do pecado. Poderá existir uma alma que volte ao seu estado de pureza inicial, que dispunha na sua criação, o instinto de felicidade descobre em ela e expande-se logo com tal impetuosidade, com tamanho ardor de caridade forçando-a para o último fim, sendo para ela insuportável este afastamento. E mais ela tem consciência,  maior é o seu tormento.


Tratado do Purgatório -   - Santa Catarina de Génova 
(Tradução do próprio)
Fonte: http://voiemystique.free.fr/catherine_de_genes_purgatoire.htm

domingo, 18 de agosto de 2013

TRATADO DO PURGATÓRIO (PARTE 2)


2. Felicidade das almas do purgatório ; Seu crescimento no olhar de Deus, o motivo da ferrugem

Não penso que se possa encontrar uma satisfação comparável àquela da alma no purgatório, à exceção daquela dos santos no paraíso. Cada dia acresce este contentamento pela ação de Deus nestas almas, ação esta  que vai crescendo como vai consumindo-se impedindo a ação divina. Este impedimento, é como uma ferrugem do pecado.

[Esta ferrugem não é um resto do pecado, uma má inclinação da vontade que   seria o efeito na alma dos pecados que ela cometeu durante sua vida terrestre ; mas uma nódoa na alma, uma falta de  perfeição, resultado dos pecados de outrora, em que a vontade despojou-se totalmente no momento da morte.]
O fogo consome progressivamente esta ferrugem e assim a alma descobre-se cada vez mais do influxo divino.
Do modo como um objeto descoberto não consegue corresponder ao reflexo do sol, não porque o sol seja insuficiente, ele que continua de brilhar, mas pelo impedimento objeto descoberto. Que venha a consumir-se o obstáculo que lhe faz véu, o objeto se descobrirá pela própria ação  do sol ; ele a aumentará  à medida  que o obstáculo diminuirá.
Assim a ferrugem do pecado é tudo aquilo que tapa a alma.
No purgatório esta ferrugem é destruída  pelo fogo. Mais ela se consome, mais ainda a alma expõe-se ao verdadeiro sol, a Deus. Sua alegria aumenta à medida  que a ferrugem desaparece e  que a alma se expõe ao raio divino. Assim uma crê e a outra diminui até que o tempo seja concluído. Mas não é o sofrimento que diminui, mas  unicamente o tempo que falta nesta pena.
Quanto à vontade, estas almas nunca podem jamais dizer que suas  penas são penas, tanto elas estão satisfeitas da inclinação divina à qual a vontade delas está unida pela pura caridade.

Tratado do Purgatório -  - Santa Catarina de Génova 
(Tradução do próprio)


sábado, 17 de agosto de 2013

TRATADO DO PURGATÓRIO

TRATADO DO PURGATÓRIO

Santa Catarina de Genova - Religiosa - 1447-1510
Como, por comparação com o fogo divino que ela ressentia dentro dela, ela compreendia o que era o purgatório e como as almas, ai, encontravam-se contentes e sofrendo.

Esta  santa alma ainda na sua carne estabeleceu-se no purgatório do amor ardente  de Deus. Ele a incendiava totalmente e a a purificava do que ela necessitava de expurgar, de forma que ao sair desta vida ela possa ser apresentada ao olhar de Deus seu  doce  amor.
Por meio deste  ardente amor, ela compreendia nela em que estado se encontram no purgatório as almas dos fieis para purificar toda espécie de ferrugem e de manchas de pecado que ainda não foram apagados durante esta vida.

Ela estabeleceu no purgatório se fogo de amor divino, ficando unida ao seu divino amor, satisfeita de tudo que ele operava nela; compreendendo que era desta maneira que as almas estavam no purgatório, ela dizia :

1. Perfeita conformidade das almas do purgatório à vontade de Deus

As almas que estão no purgatório, daquilo que penso compreender, não podem ter outra escolha que de estar neste lugar porque tal é a vontade de Deus, que na sua justiça assim o decidiu. Elas também não podem voltar para elas. Nem  podem dizer : fiz tal pecados e é por causa destes que mereço de me encontrar aqui. Não lhes é possível dizer : eu teria querido não ter feito tal pecados, por que assim iria de imediato para o céu. Nem tão pouco : este sairá  daqui antes de mim. Nem  dizer : “sairei antes dele”.
Elas são incapazes de ter qualquer recordação delas ou de outras, nem em bem nem em mal, que possa aumentar seu sofrimento. Elas tem, pelo contrário, um tal contentamento de estar estabelecidas na condição desejada por Deus e que Deus operasse nelas conforme a sua vontade, que elas não tem qualquer pensamento sobre elas nem sentem  qualquer  acréscimo de penas.
Elas apenas vem a bondade divina que trabalha nelas, esta  misericórdia que exerce sobre o homem para o levar a Deus. Em consequência, nem bem nem mal que lhes aconteça lhes pode chamar atenção. Se estas almas pudessem tomar consciência  elas não estariam mais na caridade pura.
Elas também não considerar quais foram nas suas penas a causa de seus pecados, esta ideia, não entra no seu espírito. Seria isso, uma imperfeição no ato, que não pode existir neste estado onde é impossível de cometer um pecado. Porque  elas estão em purgatório, esta causa que está nelas, que lhes foi dado a possibilidade de a ver uma única vez , no momento em que elas  saíram desta vida, e que nunca mais a vê.  Doutra forma, este olhar interior seria voltar a si.
Então estabelecidos na caridade e sem possibilidade de se desviar dele por um ato corrompido  elas estão incapacitadas de desejar, excluindo o  puro desejo da pura caridade. Colocadas neste fogo ardente em plena purificação, elas ai estão na ordem desejada por Deus. Esta inclinação divina é de puro amor ; elas não podem desviar-se em nada, porque são incapazes de cometer um pecado, assim como de  fazer um ato meritório.

Tratado do Purgatório - Santa Catarina de Génova 
(Traduçao do próprio)


sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Toda virtude e todo defeito desenvolve-se por meio do próximo

1.- Eu quero que saibas que toda virtude e todo defeito desenvolve-se por meio do próximo.
Aquele que está na minha desgraça prejudica ao próximo e a si-mesmo, que é seu principal próximo. Esta falta é geral e particular; ela é geral porque estais obrigados de amar vosso próximo como a vós mesmos, e ao amar-lo, deveis ser-lhe útil espiritualmente pelas vossas orações e vossas palavras; deveis o aconselhar e o ajudar na sua alma e no seu corpo, segundo as necessidades dele, pelo menos no desejo se não podeis fazer de outra forma.
2.- Aquele que não me ama, não ama o seu próximo, e não o amando não lhe pode ser útil. Ele prejudica-se, porque se priva da graça; ele prejudica seu próximo, porque se priva das orações e de santos desejos que me deveria oferecer e em que a fonte é o meu amor e a honra do meu nome.
3.- Assim todo o mal vem da oportunidade do, próximo que não se ama, desde que não me amais; e quando já não dispomos desta dupla caridade, fazemos o mal porque já não fazemos o bem. A quem fazemos o mal, senão a nos mesmos ou ao próximo? Não é a mim, porque o mal não me atingiria, e não olho o que me foi feito a mim, mas aquele que é feito aos outros.
4.- Fazendo o mal contra si-mesmo, porque privando-se da minha graça, não podemos, por conseguinte, prejudicar-nos mais de que isso. Fazendo o mal contra o próximo  porque não lhe damos o que lhe é devido em nome do amor, e que não me ofereçais por ele as preces  e santos desejos de caridade.
 5.- Aqui está  uma dívida geral contra toda criatura dotada de razão; mas ela é mais sagrada ao olhar de todos aqueles que vos envolvem porque estais obrigados de vos sustentar uns aos outros pelas vossas palavras e vossos bons exemplos, procurando em todas as coisas na utilidade do vossos próximo, como daquelas da vossa alma, sem paixão e sem interesse. Aquele que não agir assim falta de caridade fraterna, e faz portanto mal ao seu proximo; não só lhe faz mal por não lhe fazer bem, mas ainda ao levar-le para o mal.
6.- O pecado atual ou mental do homem: é cometido mentalmente, quando se delicia um pensamento de pecado, e quando se detesta a virtude por um efeito de amor sensitivo, que destrói a caridade que devemos ter por mim e pelo próximo. A partir do momento que concebemos assim o pecado, procriamos contra o próximo de diversas maneiras, segundo a perversidade da vontade sensitiva. É por vezes uma crueldade espiritual e corporal: (10) ela é espiritual, quando se vê ou quando vemos as criaturas em perigo de morte e de condenação pela perda da graça, e que somos bastante cruel por não socorrer ao amor da virtude e ao ódio do vício.
7.- Por vezes aumentamos esta crueldade ao comunicar aos outros: não apenas, por não dar o exemplo da virtude, mas fazendo o ofício do demónio, ao retirar o mais que poder a virtude , dos outros, e levando-os ao vício. Que maior crueldade pode-se exercer contra uma  alma, que de lhe retirar assim a vida da graça e de lhe dar a morte eterna? A crueldade contra o corpo tem a sua fonte na ganância. Não só negligenciamos a assistência do próximo, mas mais ainda lhe despojamos até sua pobreza, seja pela força, seja pela fraude, fazendo-lhe resgatar  seu bem e sua vida.
8.- Ó crueldade insensível, pela qual, eu serei sem misericórdia, se ela não for remida pela compaixão e bondade pelo próximo! Ela concebe palavras que seguem quase sempre a violência e o crime, ou das impurezas que mancham e mudam os outros, como gritos de animais imundos; e não são apenas uma ou duas pessoas, que são infetadas, mas todos aqueles que frequentam e se aproximam deste cruel corruptor.
9.- Que não conceba também o orgulho, tão avido de reputação e de honras! Despreza o próximo, elevando-se acima dele fazendo-lhe injurias. Se a sua posição social for superior, comete-se a injustiça, tornando-se até num carrasco.
10.- O minha filha, gemeis sobre todas estas ofensas e chorai sobre todas estas mortes, afim de que as tuas preces os ressuscitem  Vês quando e como os homens cometem o pecado contra a próximo e pelo seu meio. Sem o próximo, não existiria pecados secretos ou públicos.  O pecado secreto, vem de não o assistir quando o deveríamos fazer; o pecado público, é esta geração de vícios que acabo de falar. É portanto verdade que todas as ofensas são sempre feitas por meio do próximo.(11).

Diáologo de Sainte Catherine de Sienne et Oraisons - Capitulo VI 
Tradução própia

terça-feira, 13 de agosto de 2013

A COISA MAIS IMPORTANTE...

 
   
          Para aqueles que desejam conhecer em poucas palavras, o modo de atingir a perfeição para chegar a Deus, leia estes escritos de Santa Catarina de Sena, com nossa tradução da obra francesa:


          " Então Deus diz-lhe: Escuta e medita de toda a capacidade do teu espírito o que te vou dizer: Para amar-me perfeitamente, três coisas são necessárias. Primeiro distanciar, separar, retrair a tua vontade de qualquer amor e de qualquer ligação terrestre e carnal, de forma que nenhum bem passageiro e efémero que te possa agradar nesta vida, senão que seja por mim...

            A coisa mais importante, é que não deves amar-me por ti, nem amar-te por ti ou amar o próximo por ti; é preciso que me ames por mim; que te amas por mim e que amas o próximo por mim…

                O amor divino não pode sofrer nenhuma partilha dum outro amor. Conforme ficas sujo dum contagio das coisas terrenas, serás privado do meu amor e perderás a perfeição. porque, para ser puro e santo, é indispensável que a alma despreza todas as coisas sensíveis. Faz de forma que nenhuma das coisas que a minha bondade vos deu para o vosso uso te impeçam de me amar. Que, pelo contrário, te ajudem, te excite e te inflamam por mim; porque se eu as criei, e vos as dei, foi para que conheceis melhor a grandeza da minha bondade, e me amasse dum maior maior.

              Esforça-te a colocar um freio de continência nos sentidos e desejos...
              
           Logo que terás compreendido este primeiro ensinamento, então passarás ao segundo, que é duma maior perfeição: sendo que todos os pensamentos, atos e operações tenham como único objetivo a minha felicidade e minha glória. Deves aplicar-te cem cessar em louvores por meio de orações, palavras e com exemplos. Além de o fazer, também levar, tanto quando possas, aos outros, afim que todos me conheçam, amem e honrem. Este meio ainda me agrada mais que o primeiro, porque ele cumpre melhor a minha vontade.

              Quanto ao terceiro ensinamento que fica, se o seguires, fica persuadida que nada te faltará, e que chegarás á perfeita justiça. Vê em que consiste: é preciso procurar com um desejo ardente, e esforçar-te para atingir   uma disposição de espírito tal, que me sejas tão unida, e que a tua vontade  seja tão conforme à minha, que tu não queiras jamais o mal, mas ainda o bem que eu não quero.

             Afim que melhor compreendas com que ardor eu desejo estar convosco, e que tu te prestes submeter-te e unir tua vontade com a minha, vê e considera atentamente que quis que meu Filho único encarnar-se, e que minha divindade, despida de fragmento da sua majestade, uniu-se à vossa humanidade. Foi por esta prova de amor que eu vos convidei, incentivando-vos a unir vossa vontade à minha, e vos associar a mim só.

             Eu quis que meu Filho bem-amado se sujeitasse a uma morte cruel e vergonhosa da Cruz, afim que pelos seus tormentos ele limpasse vosso pecado. Porque o pecado tinha estabelecido entre mim e e vós uma ruptura que me tinha obrigado de desviar de vós o meu olhar. 

            Também vos arranjei este festim tão grande e tão pouco conhecido, Sacramento do Corpo e do Sangue de meu Filho. Ao tomá-lo como alimento, vós transformai-vos e mudais em Mim. Do mesmo  que o pão e o vinho em que vos alimentais passa na substancia do vosso corpo, de mesmo modo, ao vos alimentar dele, meu Filho, que é a mesma pessoa comigo, penetra na vossa substancia espiritual sob a aparência do pão e do vinho, e vos converteis  em mim. É o que explicava ao meu servo Agostinho quando lhe dizia: "Eu sou o alimento dos grandes. Crê e come, tu não me mudarás em ti, mas tu serás mudado em mim" 
(Cibus sum grandium: credete mandacabis; nec tu me mutabis in te, seb tu mutaberis in me.)

         Então Deus, que nunca engana os desejos dos santos, acrescenta: É certo que a felicidade consiste na perfeita renúncia de ti-mesmo: Eu te encherei da minha graça à medida que tu te despiras da tua vontade. A comunicação da minha divina vontade fará a tua perfeição pela graça, sem da qual a criatura humana está despida de virtudes e de dignidade.

           Se pretendes chegar a esta perfeição, com a mais profunda humildade, e com sincero  e intimo conhecimento da tua miséria e pobreza, trabalha numa só meta e de o desejar sem cessar: obedecer a mim só e cumprir, em tudo, a minha vontade. Para o alcançar, é necessário, com ajuda da tua imaginação e do teu julgamento, construir em ti mesmo um quarto perfeitamente fechado para receber as ordens da minha vontade, para te esconderes e aí habitares permanentemente. Em qualquer parte em que fores nunca sais daí. Qualquer coisa que vejas, nunca desprendes teu olhar.

             Que os movimentos do teu espírito e do teu corpo, sejam sempre dirigidos para a minha vontade. Não fales, não penses e não ages que para me agradar e para cumprir o que te parecer ser da minha vontade; e desta maneira, em tudo que fizeres, o Espírito Santo será teu mestre.

    Também podes o alcançar por outra via ao renunciar à tua própria vontade. Se encontrares alguém que possa instruir-te e governar-te segundo o meu belo prazer, deverás sujeitar-te à sua vontade. Confiarás-te inteiramente nele, obedecendo-lhe em todas as coisas, e seguindo continuamente seus conselhos. Porque aquele que ouve meus servos, prudentes e fieis, é a mim que escuta.
                                 
         Também quero que, com uma fé firme e com fervor incansável, medites sobre mim, teu Deus, que te criou para gozares da bem-aventurança. Eu sou o Ser eterno,  todo poderoso. Eu faço para vós tudo que for para vosso bem. Nada me pode resistir à minha vontade, e nada pode vos acontecer sem ela, porque nada se faz sem a minha permissão. O profeta Amos disse: "Nenhum mal acontece a esta cidade sem mim ou sem a minha permissão" (Amos. III, 6).   

        Medita nisto, porque sou teu Deus, sou a plenitude da sabedoria, da ciência e da inteligência, que vejo todas as coisas com toda a grandeza, e que as penetro intimamente. Ao governar-te e ao governar o céu e a terra e o mundo inteiro, não me engano nunca, nem desvio por qualquer erro. Se fosso de outra maneira, já não seria Deus e a Sabedoria suprema, Para que compreendas a eficácia da sabedoria, aprende que "tanto da falta como do castigo, eu tiro sempre um bem maior que o  mal em si..."

                                                  Santa Catarina de Sena - Tratado da Perfeição, 21 a 39
                                                                          (tradução do proprio)

                                Fonte: http://jesusmarie.free.fr/catherine_sienne_traite_perfection.html